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segunda-feira, 25 de maio de 2009

Natalia e o Papa

Ela é uma russona forte e cheia de vida. Chegou a Israel há dois anos, com um visto especial para cuidar e servir de dama de companhia a uma mulher de muita idade. Não tem nada a ver com as jovens e lindas filipinas que vêm para Israel com a mesma finalidade.


Nos dias de folga, Natália faz uns bicos, e trabalha um dia numa casa, outro noutra, ganhando por dia um salário que, em muitos países, representaria o soldo de um mês. Ela só fala russo, romeno, algumas palavras de hebraico, mas nos entendemos em francês. Veio da Moldávia. Falo com ela, com certa emoção, da terra que fez parte da Bessarábia, onde nasceram meus pais. Natália estava muito excitada com a perspectiva da vinda do Papa a Israel, e aguardava, ansiosa, o dia de sua chegada. Soube que o Papa iria visitar, primeiramente, a Jordânia, e perguntou-me: “O que ele vai fazer lá no meio dos árabes?”. Ela deu uma gostosa gargalhada: “Não acredito”, disse, quando lhe respondi que naquele país existia uma comunidade cristã e, parece até, alguns lugares santos para a Cristandade, os quais ele iria visitar.


O Papa foi recebido na Jordânia com todas as honras pelo seu monarca muçulmano, e fiquei admiradíssimo ao ver sua fotografia nos jornais acompanhado pela jovem e linda esposa do rei. (Vale lembrar que alguns importantes chefes de Estado têm se destacado por suas lindas esposas, como os presidentes da França e da Itália). Na Jordânia, o Papa fez uma importante declaração, enfatizando a profunda ligação do Cristianismo com o Judaísmo. Teve grande repercussão a vista do Papa a Israel, onde também foi recebido com todas as pompas. Manteve uma conversa muito amigável com o Presidente do Estado de Israel, Shimon Perez, que lhe entregou um presente especial: toda a “Bíblia” gravada num microchip de silicone.


O Papa visitou Yad VaShem, onde fez um discurso emocionado, no qual manifestou seu profundo pesar pelo que ocorreu no Holocausto. Encontrou-se com seis sobreviventes e trocou algumas palavras com cada um. Entre eles, havia uma mulher que sobreviveu escondida numa escola de freiras, o que lhe possibilitou ocultar sua identidade ao apresentar-se como cristã, e outro que se salvou vivendo num mosteiro. A visita do Papa a Israel ficou empanada por um desagradável incidente ocorrido em Jerusalém. Foi num encontro quase que ecumênico, que contou com a presença de líderes representando as diversas religiões. O Presidente do Tribunal Superior Muçulmano de Israel valeu-se da oportunidade para fazer um inesperado discurso de ataque violento a Israel, convocando o Cristianismo para, em todo mundo, juntar-se ao Islã, numa união de forças contra Israel.


O Papa não teve dúvidas, levantou-se e abandonou o recinto, e teria dito a seu acompanhante, manifestando a indignação pelo que aconteceu: “Como é possível uma coisa dessas?”. Até agora, não me parece ter havido qualquer reação, por parte das autoridades israelenses, ao referido e inusitado discurso, principalmente pelas palavras proferidas de forma tão grosseira por aquela autoridade religiosa. É certo que Israel é uma autêntica democracia, com todas as falhas deste tipo de regime, mas causará espécie se não for tomada alguma atitude a respeito. A liberdade deixa de existir quando extravasa para a anarquia.


A Natália não soube nada do que acabei de narrar. Ela, naquele dia, recebeu folga do trabalho, viajou cedo a Jerusalém para ver o Papa de perto e, quiçá, receber dele alguma bênção. Depois, ela comentou comigo: “Vim para Israel para ganhar algum dinheiro e ajudar minha família, que ficou para trás na Moldávia. Sou uma mulher de muita sorte e recebi o melhor presente que poderia ocorrer em minha vida: vi o Papa!”. Bento XVI, cujo nome em hebraico seria Baruch, calou-se quanto à agressão verbal ocorrida, mas manifestou de forma incisiva a sua discordância, ao retirar-se do recinto, em protesto, quando ocorreu o incidente. O Papa deu um exemplo pessoal de quem não aceita a intolerância.


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Marcos Wasserman

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